Este é o primeiro texto da 3ª edição do especial “Os governos estaduais e as ações de enfrentamento à pandemia no Brasil”, publicado entre os dias 13 e 17 de julho na página da ABCP. Acompanhe!
Este é o primeiro texto da 3ª edição do especial “Os governos estaduais e as ações de enfrentamento à pandemia no Brasil”, publicado entre os dias 13 e 17 de julho na página da ABCP. Acompanhe!
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O Paraná no epicentro da crise?
Nome dos(as) autores(as) e respectivas instituições às quais estão vinculados(as):
Luiz Fernando Vasconcellos de Miranda (UNILA); Rodrigo Rossi Horochovski (UFPR) e Maiane Bittencourt (UFPR)
Titulação dos autores e instituição em que a obteve: Luiz Fernando Vasconcellos de Miranda – Doutor em Ciência Política (UFF); Rodrigo Rossi Horochovski – Doutor em Sociologia Política – (UFSC); Maiane Bittencourt – Mestranda em Ciência Política (UFPR)
Região: Sul
Governador (Partido): Ratinho Júnior (PSD)
População: 11.433.957 (est. IBGE, 01/07/2019)
Número de municípios: 399
Casos confirmados em 10/07/2020: 39.512
Óbitos confirmados em 10/07/2020: 978
Casos por 100 mil hab.: 346
Óbitos por 100 mil hab.: 7,1
* Por: Luiz Fernando Vasconcellos de Miranda, Rodrigo Rossi Horochovski e Maiane Bittencourt
Até o início de junho, o Paraná tinha uma posição relativamente cômoda, entre as unidades federativas com menores números absolutos e proporcionais de casos e óbitos por covid-19. O governo do estado, em meados de maio, ressaltava que o Paraná tinha o menor crescimento da doença no país.
O estado estaria beneficiando-se das rápidas providências dos governos estadual e municipais, tomadas assim que o problema se instalou no país. Quando surgiram os primeiros casos no Paraná, foram baixados decretos fechando escolas, proibindo aglomerações e restringindo as atividades econômicas ao essencial.
As medidas iam na contramão do governo federal, que, temendo os efeitos econômicos da pandemia, parecia não reconhecer a gravidade da situação, instando governos e sociedade a autorizar a plena retomada das atividades econômicas. Vale mencionar que, desde o início da pandemia, dois ministros da saúde (Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich) deixaram o cargo por discordarem da abordagem que a presidência da república deu ao problema.
Apesar do cenário favorável, a situação no Paraná sofreu uma inflexão em meados de maio. Dissemos, em edição anterior do boletim, que essa dinâmica provavelmente se devia à tendência de os governos, pressionados pelos mais diversos interesses, flexibilizarem as regras do isolamento social, permitindo a reabertura gradual de lojas físicas e outros estabelecimentos, como bares e restaurantes. Em um exemplo ilustrativo, pouco antes do dia das mães, data muito importante para o comércio, shopping centers de várias cidades do estado reabriram suas portas.
De lá para cá, o cenário se modificou de modo expressivo e projeções pessimistas se confirmaram. O epicentro da pandemia vem se deslocando no território brasileiro, do norte, nordeste e sudeste para o centro-oeste e o sul, que começam a apresentar números mais preocupantes, embora suas taxas ainda sejam menores (Gráficos 1 e 2). Como resultado, os alarmantes registros diários de casos e óbitos vêm se mantendo praticamente inalterados no Brasil desde o mês de maio, com mais de mil mortes, em média, a cada dia.
O Paraná não escapou da tendência regional, registrando um salto nos novos casos e óbitos (Gráfico 3). As razões podem variar e pode ser arriscado cravar explicações muito taxativas enquanto os fatos se desenrolam. Todavia, algumas pistas podem ser exploradas.
De um lado, a piora no quadro pode resultar do maior afluxo de pessoas nos espaços públicos, em função das reaberturas. Isso não é exclusivo do Paraná, pois esta dinâmica de aumento dos casos nas semanas seguintes às flexibilizações ocorre em várias partes do mundo. Ademais, aparentemente a permissão da circulação de pessoas nos espaços públicos visando à chamada imunização do rebanho tem-se mostrado ineficaz para o controle da doença.
De outro lado, o Paraná nos últimos dias incrementou consideravelmente a testagem (Gráficos 4 e 5), atingindo a marca de mais de 1,3 mil testes/100 mil habitantes. O estado ainda está, contudo, longe de ostentar os números dos países que mais testam, nos quais o referido índice é superior a 5 mil/100 mil habitantes.
Como efeito dos dois fatores – flexibilização do isolamento e aumento da testagem –, é possível supor que os números atuais da covid-19 no estado tanto indicam um agravamento do problema, quanto refletem mais fielmente os fatos relacionados à pandemia. Isso, por óbvio, demanda uma resposta dos agentes políticos, cabendo, portanto, perguntar: como os governos têm reagido?
A tendência à flexibilização das medidas de isolamento foi revertida. A capital do estado, Curitiba, adotou em 9 de junho, o Programa de Responsabilidade Sanitária e Social, pelo qual, mediante um sistema de bandeiras, monitora a situação da pandemia a partir de três cores: amarelo (alerta), laranja (risco médio) e vermelho (risco alto) [1]. Logo a seguir, no dia 13/06, quando a ocupação de leitos de UTI por pacientes com covid-19 chegou a 74%, o município aumentou o alerta de amarelo para laranja, o que na prática resultou em maior restrição para a circulação de pessoas e funcionamento dos serviços [2].
As providências não se resumem à capital e, em 30 de junho, em face do agravamento da situação, o governo estadual decretou um aperto nas restrições [3], impondo, entre outras coisas, o fechamento de atividades não essenciais em sete regionais de saúde, abrangendo 134 municípios. A medida começou a vigorar em primeiro de julho e tem duração inicial de 14 dias, prorrogáveis por mais sete.
Em suma, o Paraná não logrou manter o quadro relativamente confortável que exibia até o início de junho e que levou ao já famoso paradoxo: quanto mais eficaz for o isolamento, mais ele parece desnecessário a parcelas relevantes da sociedade. A consequência é o aumento das pressões sobre os agentes políticos para flexibilizá-las. Até aqui, o resultado tem sido um “abre e fecha” que não tem equacionado satisfatoriamente nem a emergência sanitária, nem seus desastrosos efeitos sociais e econômicos. Na medida em que estes parecem inevitáveis em qualquer cenário, cabe perguntar se não é chegada a hora de um maior protagonismo estatal para a preservação da vida e de condições materiais mínimas, pois já podemos estar no limiar da adoção de uma economia de guerra. As próximas semanas serão cruciais nesse sentido.
Referências bibliográficas: