ESPECIAL ABCP: As ações do Rio Grande do Norte no enfrentamento à pandemia

Este é o décimo sétimo texto da 5ª edição do especial “Os governos estaduais e as ações de enfrentamento à pandemia no Brasil”, publicado entre os dias 8 e 12 de fevereiro na página da ABCP. Acompanhe!

Este é o décimo sétimo texto da 5ª edição do especial “Os governos estaduais e as ações de enfrentamento à pandemia no Brasil”, publicado entre os dias 8 e 12 de fevereiro na página da ABCP. Acompanhe!

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Uma possível porta da esperança? Vacinação e pandemia no Rio Grande do Norte

Nome da autora e instituição a que está vinculada: Sandra Gomes (Departamento de Políticas Públicas – UFRN)

Titulação da autora: Doutora em Ciência Política

Região: Nordeste

Governador (Partido): Fátima Bezerra (PT)

População: 3.506.853 (est. 2019)

Número de municípios: 167

Casos confirmados em 31/01/2021: 140.704

Óbitos confirmados em 31/01/2021: 3.288

Casos por 100 mil hab.: 4.012, 3

Óbitos por 100 mil hab.: 93,76

Data de início da vacinação: 19 de janeiro

Acesse aqui o Plano de vacinação do estado


* Por: Sandra Gomes

A situação epidemiológica do Rio Grande do Norte manteve a tendência de queda em casos e óbitos por covid até novembro de 2020 como especulado no último Boletim da ABCP publicado em agosto passado. A melhora desse cenário, até aquele momento, motivou a implementação de todas as fases do plano de reabertura controlada das atividades econômicas, completado ao final de outubro por meio de decretos da governadora.

Como se pode observar na Figura 1, o nível de normatização pelo governo do Estado do RN, em termos de medidas para o isolamento social, cai progressivamente entre final de julho e outubro. De um elevado nível de medidas restritivas tomadas, especialmente entre março e abril (escore 7,5 na metodologia adotada por Moraes, 2020 na Figura 1) – momento em que várias atividades foram suspensas -, chega-se, ao final de outubro, a um reduzido índice de 1,7.

Fonte: Moraes (2020)

De fato, observa-se que o cenário de progressiva melhora nos indicadores de casos, óbitos, ocupação de leitos críticos de UTI, dentre outros, motiva o comitê científico do Estado do RN a sugerir a adoção progressiva das fases de reabertura econômica, ainda que tenha havido algumas idas e vindas iniciais na medida em que havia dúvidas sobre se as sinalizações de queda se confirmariam ou não. Já em 13 de julho, a governadora vai emitindo os primeiros decretos com flexibilizações de lojas, eventos e restaurantes, porém com protocolos sanitários rígidos e específicos naquilo que o governo chamaria de “retomada gradual responsável das atividades econômicas”.

No início de agosto, as situações mais críticas eram prevalentes nas cidades de interior e de menor porte populacional (especialmente nas regiões do Vale do Açu e do Seridó), isto é, o arrefecimento no ritmo de contaminações nas cidades maiores explica, em boa parte, a melhora nos índices sanitários do Estado como um todo, ocultando focos problemáticos em determinadas localidades. Ainda em agosto, representantes de escolas privadas e de pais de alunos pedem audiência com comitê científico estadual para protocolos de volta às aulas, mas o comitê emite parecer entendendo que ainda não era possível. Nesse mesmo mês, vários representantes de associações ligados ao setor turístico e de eventos do Estado do RN apresentam seu plano de retomada ao comitê, que sugere várias adequações, e é aprovado. Outras associações de classe já tinham, antes disto, colaborado para a elaboração do plano de retomada econômica como detalhamos em Boletins anteriores publicados pela ABCP. 

Mas é o decreto estadual de 26 de outubro de 2020 que, na prática, acaba por revogar todas as normatizações restritivas anteriores, o que explica, assim, o índice de regulamentação de medidas de isolamento social ter caído para 1,7, o menor desde o início da pandemia. Esse fato se reflete no aumento da circulação de pessoas, especialmente para o trabalho, e estava ancorado na melhora dos indicadores sanitários e de uma grande pressão de diversos segmentos econômicos da necessidade de retorno de suas atividades assim como de financiamento do próprio poder público por meio da arrecadação fiscal. 

Com efeito, naquele momento, a epidemia parecia estar arrefecendo no RN como se observa nos Gráficos 1 e 2, que descrevem a média móvel de 15 dias para os casos e óbitos por covid no Estado. 

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A média móvel de novos casos (gráfico 1) tem queda a partir de início de julho assim como a de óbitos (gráfico 2), porém, ao final do mesmo mês, dado o intervalo usual entre contaminação, agravamento e falecimento. O que não era esperado, porém, é que se começasse a observar novo crescimento: a partir de outubro o número de casos confirmados de covid volta a crescer e, ao final de novembro, isto se reflete na elevação de óbitos. Como em outros locais no Brasil, não se verificou no caso do RN uma situação de platô que pudesse sugerir o fim de uma primeira onda e o início de uma segunda onda. Isto é, apesar da queda observada no período, não se atingiu uma situação de absoluto controle da pandemia no Estado em momento algum. 

O que teria alterado essa tendência de queda é, obviamente, uma questão em aberto. As razões aventadas vão desde a própria retomada das atividades econômicas no Estado e, como consequência, a maior circulação de pessoas, aglomerações (transporte público, por exemplo) com possíveis efeitos na sensação de “volta à normalidade” por parte da população assim como uma completa ignorância das regras de segurança sanitárias como distanciamento mínimo e, em especial, o uso de máscaras. Não se descartam, ainda, as aglomerações que teriam sido geradas nas campanhas eleitorais de outubro, e, mais recentemente, a nova variante do vírus que circula no Brasil ao menos desde dezembro, as aglomerações vistas no RN nas festas de Natal e Ano Novo (com repercussão nas mídias nacionais como nos casos de Pipa e São Miguel do Gostoso), dentre outros fatores. Porém, as análises temporais dos dados de volta de crescimento dos casos ao final de setembro e início de outubro permitem especular que possa haver sim uma possível relação de causalidade entre a implementação das fases constantes do plano de retomada das atividades econômicas do RN e a piora nos indicadores sanitários. 

A análise do comitê científico do RN em 9 de setembro (Recomendação 18/2020) mostra que a expectativa, com base nos dados daquele momento, era de constante queda até final do ano, o que, de fato, não ocorreu. O monitoramento regular da situação sanitária pelo comitê foi fundamental para identificar essa mudança de padrão que, obviamente, não poderia ser prevista apenas por modelos matemáticos. Em 1º de dezembro, o comitê chega a fazer uma recomendação para que se volte a regular algumas atividades não essenciais, mas não há registro de decretos da governadora nesse sentido. 

Com relação às campanhas eleitorais, também não se tem claro se estas podem ter tido um impacto no aumento da contaminação. Com um elevado nível de abstenção eleitoral na capital (Natal) – de mais de 28% – e com o aumento das campanhas por meio virtual, não se tem evidências no momento de que possam ser um fator explicativo ou, alternativamente, um fator complementar ao crescimento de casos a partir de setembro e outubro. Por certo, houve casos de candidatos diagnosticados com covid logo após as campanhas eleitorais amplamente divulgados na mídia local. 

Com relação aos resultados eleitorais, destaca-se a reeleição do prefeito da capital, Álvaro Dias (PSDB), já no primeiro turno com 57% dos votos, bem distante do segundo colocado, Senador Jean, do PT, que alcança 14% dos votos válidos. O prefeito conseguiu manter a sua boa avaliação geral e, em certa medida, pode ter sido beneficiado pelas decisões mais duras tomadas pelo governo do RN no que se refere ao controle da pandemia como já argumentamos em textos anteriores. De qualquer modo, o prefeito de Natal é uma figura que se coloca como contraposto político ao governo do Estado e a troca de farpas permanece sendo frequente e comum de ambas as partes. Essa posição antagônica em termos políticos parece continuar a agradar o eleitorado mais à direita do município de Natal, que tem assim se revelado desde as eleições gerais de 2018, beneficiando o candidato do PSDB. Por outro lado, tem-se uma importante renovação no caso da Prefeitura de Mossoró com a derrota do candidato da tradicional família Rosado. Para uma análise detalhada e interessante dessas duas eleições, sugiro ao leitor ver Lacerda (2020).

Em termos de gestão para a vacinação, a Secretaria de Saúde do RN apresenta uma primeira versão de seu plano de vacinação em 18 de dezembro, imediatamente após a divulgação do Plano Nacional de Imunização pelo Ministério da Saúde. Inicia-se uma rápida organização da rede de vacinação no Estado, com capacitação de profissionais (em conjunto com a Fiocruz), adaptação e informatização das salas de vacina, criação de um cadastro próprio (RN Mais Vacina) da população, acessível pela internet e implantado em todos os 167 municípios do Estado em um sistema integrado entre Estado e municípios assim como com os sistemas nacionais do SUS. Ainda em dezembro, a Secretaria de Saúde do RN anuncia que tinha uma rede de frios capaz de receber as vacinas da Pfizer – que exigem conservação em temperaturas bastante baixas -, por conta de equipamentos existentes nos hospitais e laboratórios das instituições públicas superiores de ensino em diversos locais do Estado. Porém, como é sabido, não foram negociadas compras desta vacina pelo Brasil. De todo modo, isso mostra uma rápida capacidade de mapeamento das condições de vacinação no Estado, inclusive de seus pontos frágeis e necessidades de readequações, que embasou o planejamento da vacinação com bastante rapidez pela gestão pública. 

No momento atual, foram vacinados cerca de 43 mil potiguares sendo que, nesta primeira fase, as prioridades são os profissionais de saúde, idosos e trabalhadores em instituições de longa permanência, que seguem também critérios de prioridade enquanto não há doses suficientes para atender toda a população mesmo entre os segmentos prioritários. A governadora se posicionou, publicamente, em defesa de que professores e profissionais da educação estejam em ordem de prioridade nas fases seguintes, uma demanda que parece estar na ordem do dia tendo em vista a crescente pressão por volta a aulas presenciais em diversas partes do país. 

A técnica de enfermagem Maria das Graças de Oliveira, há 35 anos trabalhadora do SUS, foi a primeira vacinada no RN em 19 de janeiro, um ato simbólico que, como em muitos outros lugares do Brasil e do mundo, produziu grande emoção na população e uma certa volta de esperança no futuro que, há tempos, não víamos. O desejo coletivo é claro: “vacina para todos”. A ver. 

Referências bibliográficas:

[1] Lacerda, Alan. Eleições potiguares: calmaria em Natal e o declínio dos Rosado em Mossoró. Observatório das Eleições, 2020. https://noticias.uol.com.br/colunas/observatorio-das-eleicoes/2020/12/03/eleicoes-potiguares-calmaria-em-natal-e-o-declinio-dos-rosado-em-mossoro.htm 

[2] Moraes, RF de. Índice de medidas legais de distanciamento social. Ipea; 2020

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