ESPECIAL ABCP: As ações do Rio Grande do Sul no enfrentamento à pandemia

Este é o sexto texto da 5ª edição do especial “Os governos estaduais e as ações de enfrentamento à pandemia no Brasil”, publicado entre os dias 8 e 12 de fevereiro na página da ABCP. Acompanhe!

Este é o sexto texto da 5ª edição do especial “Os governos estaduais e as ações de enfrentamento à pandemia no Brasil”, publicado entre os dias 8 e 12 de fevereiro na página da ABCP. Acompanhe!

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Rio Grande do Sul: das eleições em Porto Alegre ao começo da vacinação

Nome do(a) autor(a): Rodrigo Mayer

Instituições às quais o autor está vinculado: Universidade Estadual de Ponta Grossa

Titulação: Doutor em Ciência Política pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Região: Sul

Governador (Partido): Eduardo Leite (PSDB)

População: 11,4 milhões

Número de municípios: 497

Casos confirmados em 01/02/2021: 548.062

Óbitos confirmados em 01/02/2021: 10.715

Casos por 100 mil hab.: 4.817,2

Óbitos por 100 mil hab.: 94,2

Data de início do Plano de vacinação: 18/01/2021

Acesse aqui o Plano de vacinação do estado


* Por: Rodrigo Mayer

A campanha eleitoral de Porto Alegre foi marcada desde o começo pela oposição entre a candidatura de Manuela d’Ávila e a direita, inicialmente fragmentada. Isso não significa que não houvesse outras candidaturas de esquerda, mas sim que a candidata comunista despontou como o principal nome progressista. No campo conservador, a direita se dividiu em três candidaturas: a do prefeito Marchezan (PSDB), buscando a reeleição (mas com alta rejeição), a do ex-prefeito Jorge Fortunati (PTB) e a de Sebastião Melo (MDB), ex-vice de Fortunati.

A fragmentação da direita nas eleições foi resolvida ainda no primeiro turno, com Fortunati desistindo da candidatura devido à impugnação da candidatura de seu vice, fato que beneficiou a candidatura de Melo. Este se  posicionou como o principal competidor contra a esquerda e no segundo turno angariou apoio dos demais candidatos conservadores, do governador do Estado e do presidente da República.

Desde o inicio, a campanha eleitoral foi fortemente marcada pela grande quantidade de fake news contra Manuela. As noticias falsas continuaram no segundo turno, demonstrando a baixa capacidade do TRE em lidar com elas de modo eficaz. Dentre as inúmeras fake news destaco duas: a primeira se deu com apoiadores de Melo percorrendo a cidade em um carro de som, falando que, se candidata comunista ganhasse, o município se transformaria em uma Venezuela; a segunda foi a divulgação de uma pesquisa falsa na véspera do segundo turno do pleito eleitoral.

Em relação à pandemia, os dois candidatos ocuparam polos opostos. Manuela defendeu o distanciamento social, crédito para micro e pequenas empresas e a compra de vacinas pelo município. Melo se posicionou a favor da abertura do comércio e maior flexibilização dos protocolos, para que a economia pudesse reagir. O prefeito eleito também defendeu a compra da vacina por parte do município, desde que o governo federal não comprasse. No entanto, o partidário do MDB defende que a mesma não seja obrigatória. Ao individualizar a vacinação, o prefeito eleito ignora que a mesma é um pacto social para que a doença seja controlada.

Uma das primeiras medidas de Sebastião Melo como prefeito foi relaxar as medidas de controle da pandemia. O governante argumenta que o antigo prefeito se guiava mais pela política do que pela ciência, no entanto, neste primeiro mês intensificou a distribuição do chamado “kit covid” (hidroxicloroquina, cloroquina, ivermectina, azitromicina) defendido pelo governo federal (e não recomendado pelo governo estadual), na rede municipal de saúde. O kit, sem eficácia comprovada e não recomendado pela SBI (Sociedade Brasileira de Infectologia), é distribuído conforme prescrição médica e assinatura de um termo de consentimento do paciente, que deve assumir os riscos.

A distribuição dos remédios sem eficácia contra a covid-19 consiste, em certa medida, em uma estratégia populista por parte do prefeito. Ele busca uma solução simples – mesmo ineficaz – frente a um problema complexo que exige a formulação de políticas públicas efetivas.

Ainda na questão das políticas públicas, a distribuição dos remédios do kit pode levar à explosão de problemas de saúde causados pelos efeitos colaterais dos remédios, tais como problemas hepáticos, renais, cardíacos, aumento de resistência de bactérias, entre outros.

O período após as eleições foi marcado pelo recrudescimento da pandemia no Rio Grande do Sul. No começo de outubro, os indicadores de novas hospitalizações e óbitos apresentaram melhorias, levando ao reaparecimento de regiões classificadas com a bandeira amarela (baixo risco) no estado. Entretanto, já no final de outubro os indicadores voltaram a crescer e ocorreu o aumento de classificações de risco alto (bandeira vermelha). Em 14 de dezembro foi atribuída bandeira preta para duas regiões (Bagé e Pelotas), porém a classificação não indica a necessidade de lockdown, mas sim de maiores cuidados. Nas semanas seguintes, somente as bandeiras laranja e vermelha foram atribuídas.

rsGráfico 2 – Número de óbitos por Covid-19 no Rio Grande do Sul  Fonte: Site da Secretaria de Saúde do Rio Grande do Sul, 2021.

O crescimento do número de casos é consequência de uma serie de fatores. Primeiro, durante o período eleitoral houve um aumento de aglomerações causadas pelas campanhas. O segundo ponto foi a contínua cessão aos interesses econômicos, à medida que as políticas de flexibilização concentraram-se na abertura do comercio sem estudos sobre medidas para mitigar a circulação das pessoas (horários alternativos para diminuir as aglomerações no transporte coletivo, por exemplo). As festas de fim de ano também contribuíram e seus efeitos podem estar ocultos devido à circulação das pessoas entre estados e municípios. Por fim, é importante ver o impacto das novas mutações da covid-19 no aumento de casos e óbitos.

Os modelos de distanciamento controlado são importantes para influenciar a ponta final da pandemia (número de casos e internações), mas, sem o complemento de políticas de testagem em massa e políticas públicas para diminuir os efeitos econômicos e sociais da pandemia, sua eficácia é incompleta.

A ausência de coordenação entre os níveis (sobretudo pela omissão e negacionismo do governo federal no combate à pandemia) e a incapacidade dos estados de irem além de modelos de distanciamento controlado (que ao longo do tempo foram se tornando cada vez mais flexíveis) levaram a uma situação em que a espera por uma vacina se tornou a principal política.

O maior desafio do país está em como lidar com a falta do imunizante. A demora e a resistência do governo federal em adquirir vacinas, aliada à política de desindustrialização e diminuição do investimento em ciência e tecnologia (tanto no nível federal quanto no estadual), levou ao aumento da dependência em relação à indústria farmacêutica estrangeira e dificultou a criação de uma vacina nacional.

Até o dia 29 de janeiro o Rio Grande do Sul havia recebido um pouco mais de 511 mil doses de imunizantes e vacinado aproximadamente 145 mil cidadãos, a grande maioria dos profissionais da saúde e idosos institucionalizados. No entanto, não basta apenas começar a vacinação, é preciso formular políticas para que a mesma seja efetiva, além de formular políticas públicas para lidar com a pandemia durante o processo, de modo a evitar o aumento de aglomerações e de contágios.

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